Em março de 2023, o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) foi inadmitido como amicus curiae (amigo da corte) na Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 81/DF (ADC 81), que visava validar o artigo 3º da Lei 12 871/2013, a Lei dos Mais Médicos. O dispositivo trata sobre as exigências para abertura de novos cursos de medicina e condiciona a autorização para instalação dos cursos a chamamentos públicos prévios.
Apesar da negativa, seis meses depois, em setembro passado, o sindicato contratou escritórios de advocacia para representá-lo na referida ação. Os contratos somam R$ 5,7 milhões, mas não foram pagos pela entidade, e sim pela Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), a autora da ação. Ao menos é isso que indica os documentos aos quais o CIDADE teve acesso. A negociação teria sido realizada pelo então diretor geral e atual vice-presidente do Simers, o médico Fernando Uberti Machado.
A ADC 81 visava garantir a validade das exigências previstas na Lei dos Mais Médicos, impedindo a abertura de cursos de forma indiscriminada. Com a reconhecimento da constitucionalidade do artigo, esses cursos somente poderão ser abertos se houver o chamamento público prévio, tal como esperava a Anup.
Acontece que a associação é formada por universidade que se utilizaram justamente da alegada fragilidade do artigo para instalar os seus próprios cursos, autorizados por força de decisão judicial. A ação seria, portanto, uma medida para reduzir a concorrência.
Entre os documentos aos quais a reportagem do Jornal CIDADE teve acesso, há os contratos e as procurações que confirmam a contratação dos advogados para representar o sindicato na ADC 81, com data posterior a decisão do ministro Gilmar Mendes de não permitir que o Simers ingressasse na ação. Há ainda uma declaração de ausência de responsabilidade financeira, apontando o papel de cada um na relação, e deixando claro que o pagamento pelos serviços era de responsabilidade da Anup, e não do Sindicato.
O CIDADE também teve acesso a capturas de telas que mostram conversas entre o então diretor e um assessor, sobre como tais documentos deveriam ser construídos, a fim de garantir que a entidade não fosse responsabilizada financeiramente.
Contratos secretos
Segundo fontes ouvidas pelo CIDADE, as negociações acerca destes contratos teriam ocorrido de forma sigilosa, com o conhecimento apenas de “quatro ou cinco pessoas”, que integram o “núcleo duro” do sindicato. Ou seja, não teriam passado pela diretora da entidade, tampouco pelo Conselho Fiscal.
A reportagem ouviu diretores médicos do sindicato que garantiram não ter conhecimento sobre a existência de tais contratos ou negociações, tampouco, sobre o destino dos recursos citados, mas que não querem se identificar, pois, temem retaliações.
Questionado pela reportagem sobre o tema, o médico Antônio Carlos de oliveira Castro, membro do Conselho Fiscal da entidade, disse que não pode dizer se tinha ou não conhecimento sobre o tema, pois está “limitado a uma questão de sigilo”.
Fonte: Jornal Cidade.